Detalhe
O livro saiu à rua
Em abril de 2014 o Arquivo Municipal de Lisboa (AML) inaugurava, no edifício da rua da Palma e no Largo do Intendente, a exposição O arquivo saiu à rua, comemorando, desta forma, os 40 anos do 25 de Abril de 1974. Para a exposição, foram selecionados 80 cartazes políticos do espólio de José Neves Águas1, alusivos a este acontecimento. Datados entre 1974 e 1989, e representativos de diferentes tipologias e características do universo gráfico, divulgaram concertos, espetáculos, exposições, feiras e comícios políticos. Neste conjunto, é possível identificar a autoria de artistas e designers, como João Abel Manta, Maria Helena Vieira da Silva, Vespeira, Rogério Ribeiro, Carlos Rafael, Sebastião Rodrigues, entre outros, assim como autores não identificados.
A partir da ideia de cartaz, foi proposto a 18 artistas, ilustradores e designers a criação de uma peça que celebrasse a liberdade, 40 anos depois. Assim, colaboraram neste projeto Alex Gozblau, Alexandre Farto aka Vhils, André Ruivo, Barbara Says, Gonçalo Pena, João Catarino, João Fonte Santa, João Maio Pinto, Jorge dos Reis, Lorde Mantraste, Luís Miguel Castro, Luísa Barreto, Madalena Matoso, Mariana Cáceres, Nuno Saraiva, Pedro Silva, Susa Monteiro e Tiago Albuquerque. Alguns viveram o período anterior ao 25 de Abril enquanto outros, mais jovens, nasceram e cresceram em democracia. Todos trouxeram leituras diversas que refletiram o contexto social, político e cultural do país.
Os cartazes concebidos por cada participante estiveram expostos em MUPIs no Largo do Intendente, numa apresentação relacionada com a importância histórica desta data. Esta mostra foi uma extensão da exposição presente no edifício da rua da Palma, estabelecendo, assim, uma ponte entre a documentação do AML e a produção contemporânea.
Deste projeto nasceu o livro O arquivo saiu à rua, publicado em 2015, um ano depois da inauguração, que se evidencia neste Documento do Mês. Nele estão presentes os 18 cartazes contemporâneos, a documentação exposta pertencente ao espólio de Neves Águas assim como um conjunto de textos de vários autores que complementam o livro. Sofia Castro apresentou este espólio documental contextualizando as escolhas expositivas, assim como uma reflexão sobre os 18 cartazes contemporâneos e a sua forma de exposição. Quatro investigadores de diferentes áreas, fizeram uma análise crítica da documentação referida: Luísa Pires Barreto abordou a questão gráfica dos cartazes, a composição, as cores, os símbolos, as fotografias, a autoria e, claro, a tipografia; por sua vez, Ilda da Moeda e João Santareno apresentaram dois olhares diferentes, de idade, identidade e naturalidade na questão da semiótica, refletindo sobre a expressão, a representação, a interpretação, as referências estilísticas, alguns revivalismos e a comunicação destes cartazes; por fim, Jorge dos Reis fez uma viagem tipográfica através de quatro critérios de análise, a literacia, os caracteres, a textura e o espaço branco.
Assim, a mostra de MUPIs, a exposição de cartazes e o estudo sobre ambos foram reunidos em livro com a mesma identidade gráfica que se apresenta como fio condutor entre a exposição e a publicação e representa o marco das comemorações dos 40 anos do 25 de Abril pelo Arquivo Municipal de Lisboa.
Desde que se assinalou esta data, o AML editou mais de três dezenas de livros que acompanharam a organização de ações culturais diversas, tendo por base os mais variados suportes: papel, fotografia, vídeo ou documentos gráficos, entre outros.
Estas edições são o testemunho de diferentes momentos que decorreram desde 2014 e que questionam, refletem e trabalham sobre o passado, o presente e o futuro, a cidade e o seu património documental, nas mais diversas vertentes. Algumas foram o resultado de profícuas parcerias com outras entidades, e todas procuraram alcançar públicos diferenciados, revelar e construir o trajeto do Arquivo na cidade, esboçando uma memória de Lisboa.
Atualmente, estão disponíveis para consulta nas bibliotecas e salas de leitura do Arquivo e são brevemente enumeradas de seguida.
Recuando ao ano de 2015, o AML, numa parceria com a editora Scribe, publica o catálogo Ana Maria de Sousa e Holstein Beck, Fotografia privada 1912-1958, obra que reflete a exposição que esteve patente ao público dois anos antes, no Arquivo Fotográfico. Ainda no final do ano, a propósito da exposição com o mesmo título, é publicado o catálogo A grande guerra em fotografia estereoscópica, a coleção de Sousa Guimarães.
No ano seguinte são lançados dois livros com documentação do Arquivo Histórico: Extraordinários sucessos do terramoto 1755: Memória histórica de frei Tomás de Aquino a transcrição do manuscrito do frade beneditino, e o Livro dos Pregos, da coleção Documentos do Arquivo Municipal. Ainda o catálogo de fotografia, no âmbito da exposição Lisboa, uma grande surpresa.
Passado e Presente – Lisboa, Capital Ibero-americana de Cultura 2017 é celebrada em Lisboa. Ao longo deste ano, o AML publica o catálogo de exposição Archivo Cordero, com imagens da autoria do fotógrafo boliviano, Julio Cordero. É também lançado o catálogo Implosões, construções e demolições, ilustrativo da exposição, complementado pela instalação sonora de Fernando Fadigas, reproduzida num CD que acompanha a publicação.
O que é o Arquivo?, publicado em 2018 em parceria com a Sistema Solar, é um trabalho de autoria e edição partilhada entre os diferentes oradores do encontro O Laboratório I: Arte/Arquivo. Ainda em 2018 são publicados três livros de fotografia no âmbito das respetivas exposições: compêndio de observações fotográficas – luz e cegueira de Valter Ventura, fotografias de trabalho e outros desenhos de Carlos Nogueira, e Helena Corrêa de Barros, Fotografia, a minha viagem preferida.
No ano seguinte, o AML lança três novos livros dedicados a diferentes fotógrafos: de Jorge Guerra, Saudade de Pedra, de Pauliana Valente Pimentel, O Narcisismo das Pequenas Diferenças, e 4 Gerações em Lisboa com fotografias de Joshua Benoliel, Judah Benoliel, Joshua Benoliel Ruah e Clara Ruah.
Ainda em 2019 publicam-se Pão, carne e água: memórias de Lisboa medieval, catálogo da exposição com o mesmo título, que revela os hábitos alimentares da cidade durante a época referida; e o livro Um Mapa de Lisboa no Cinema, na sequência de três edições do encontro de cinema comentado, Topografias Imaginárias.
Mónica de Miranda, Contos de Lisboa é publicado em 2020, a par da exposição homónima de vídeo e fotografia, assim como Éden, de Daniel Blaufuks, selecionado pela PhotoESPAÑA para melhor livro de fotografia do ano, e o livro Olhar Cassiano, decorrente do concurso de fotografia organizado pelo AML no ano em que se assinalam os 50 anos da morte de Cassiano Branco, de cujo espólio o Arquivo é detentor.
No ano de 2021 são publicados: o terceiro número da coleção Documentos do Arquivo Municipal, o Livro Carmesim; Eu nem sabia que Marvila existia, decorrente de uma parceria com a Sistema Solar, fruto do terceiro encontro O que é o Arquivo? e da terceira edição da TRAÇA – mostra de filmes de arquivos familiares; e Artur Pastor, em parceria com a Fundação Francisco Manuel do Santos. No ano seguinte celebram-se os 100 anos do nascimento deste fotógrafo e o AML, em parceria com a editora Manjericon, lança uma nova publicação intitulada Portugal país de contrastes.
Ainda em 2022 são publicados dois novos livros de fotografia, a imagem contextualizada, que assinala uma década de um projeto homónimo dedicado ao trabalho de novos talentos na fotografia, e No Planeta onde vivo, de Guilherme Silva, fotojornalista com um vasto trabalho na área de investigação, mas também na fotografia artística.
Em 2023 é lançado o catálogo documental Políticas de Habitação em Lisboa, da Monarquia à Democracia e o livro A Dimensão imersiva, do médico e fotógrafo Jorge Marçal da Silva.
Este ano, no contexto das comemorações do 50 Anos do 25 de Abril, foi publicado o livro/brochura 50 Anos 25 de Abril, O Processo de democratização da Câmara Municipal de Lisboa, que integra a coleção Memórias em arquivo. Esta coleção, publicada ao longo dos últimos oito anos, foca-se em diferentes aniversários de instituições, acontecimentos históricos, políticos, culturais ou de construções simbólicas da cidade de Lisboa. A primeira brochura desta coleção foi dedicada aos 50 anos da Ponte 25 de Abril, que acompanhou uma exposição no Centro de Informação Urbana de Lisboa (CIUL), a segunda aos 20 anos da Expo’98, assinalados em 2018, e, no ano seguinte, publicava-se a terceira, a propósito dos 125 anos do Teatro Municipal de São Luiz. Em 2022 a quarta brochura desta coleção é dedicado aos 30 anos da Videoteca, também esta a acompanhar uma exposição sobre a história deste equipamento.
Ao longo destes 10 anos, o AML publicou os Cadernos do Arquivo Municipal, revista científica de acesso aberto, que adotou um novo formato digital em 2014, diferenciando-se, assim, das edições anteriores. Desde então, foram publicados 22 números, com artigos em quatro línguas, explorando diversas áreas das Ciências Sociais e Humanas. A revista destaca o acervo do Arquivo, especialmente através da secção Documenta. Além do formato digital, foram publicados dois números comemorativos em suporte papel, que celebraram os 200 anos da Revolução Liberal e o 25 de Abril de 1974 – Escritos em Liberdade.
A política editorial do Arquivo Municipal de Lisboa, implementada na última década, reflete as diversas iniciativas realizadas neste período. É o conjunto destas edições, marcado por um trabalho gráfico próprio, que perpetua, através do registo escrito, ações culturais por natureza efémeras, onde só o testemunho dos livros permite o acesso ao passado e à história da instituição.
Joana Pinheiro
Dezembro 2024
Arquivo Municipal de Lisboa
1 O espólio particular do jornalista José Neves Águas encontra-se à guarda do Arquivo Municipal de Lisboa e é constituído fotografias, cartazes, folhetos e outros documentos gráficos, correspondentes ao período entre 1948 e 1990.